Na catequese de hoje o Papa Francisco meditou sobre São José como pai putativo de Jesus
O Santo Padre disse acreditar que é muito importante pensar a paternidade hoje, porque vivemos uma época de orfandade notória e referiu-se ao comportamento generoso daqueles que se abrem a acolher a vida através da via da adopção.
“Hoje com a orfandade existe um determinado egoísmo. Há dias, falei sobre o inverno demográfico que há actualmente: as pessoas não querem ter filhos, ou apenas um e nada mais. E muitos casais não têm filhos porque não querem, ou têm só um porque não querem outros, mas têm dois cães, dois gatos… Pois é, cães e gatos ocupam o lugar dos filhos. Sim, faz rir, entendo, mas é a realidade. E esta negação da paternidade e da maternidade diminui-nos, cancela a nossa humanidade.
Ter um filho é sempre um risco, quer natural quer adoptivo. Mas pior é não os ter, é negar a paternidade, negar a maternidade, tanto a real como a espiritual. A um homem e a uma mulher que voluntariamente não desenvolvem o sentido da paternidade e da maternidade, falta algo principal, importante. Pensai nisto, por favor.”
PAPA FRANCISCO
AUDIÊNCIA GERAL
Sala Paulo VI, Quarta-feira 5 de Janeiro de 2022
Catequese sobre São José 6. São José, o pai putativo de Jesus
Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje meditaremos sobre São José como pai de Jesus. Os Evangelistas Mateus e Lucas, apresentam-no como o pai putativo de Jesus e não como pai biológico. Mateus especifica-o, evitando a fórmula “gerou”, utilizada na genealogia para todos os antepassados de Jesus; mas define-o como «esposo de Maria, da qual nasceu Jesus, chamado o Cristo» (1, 16). Enquanto Lucas afirma isto, dizendo que era pai de Jesus «como se supunha» (3, 23), isto é, aparecia como pai.
A fim de compreender a paternidade putativa ou legal de José, é necessário ter em mente que em tempos antigos no Oriente a instituição da adopção era muito comum, mais do que é hoje. Pensemos no caso comum em Israel do “levirato”, formulado da seguinte maneira no Deuteronómio: «Se os irmãos residirem juntos, e um deles morrer sem deixar filhos, a viúva não poderá casar com um estranho; o seu cunhado é que se juntará a ela e a tomará como mulher, observando o costume do levirato. E o primeiro filho que ela tiver usará o nome do irmão morto, a fim de que esse nome não se extinga em Israel» (25, 5-6). Por outras palavras, o pai desta criança é o cunhado, mas o pai legal continua a ser o falecido, que dá ao recém-nascido todos os direitos hereditários. O objectivo desta lei era duplo: assegurar a descendência do falecido e a preservação do património.
Como pai oficial de Jesus, José exerce o direito de impor o nome ao filho, reconhecendo-o juridicamente. Juridicamente é o pai, mas não generativamente, não o gerou.
Antigamente o nome era o compêndio da identidade de uma pessoa. Mudar o nome significava mudar a si mesmo, como no caso de Abraão, cujo nome Deus mudou para “Abraão”, que significa “pai de muitos”, pois, diz o Livro do Génesis, «farei de ti o pai de inúmeros povos» (17, 5). O mesmo vale para Jacob, que é chamado “Israel”, que significa “aquele que luta com Deus”, porque lutou com Deus para o forçar a conceder-lhe a bênção (cf. Gn 32, 29; 35, 10).
Mas, sobretudo, dar o nome a alguém ou a algo significava afirmar a própria autoridade sobre o que era denominado, como fez Adão quando conferiu um nome a todos os animais (cf. Gn 2, 19-20).
José já sabe que para o filho de Maria havia um nome estabelecido por Deus – o nome de Jesus é dado pelo seu verdadeiro pai, Deus – o nome “Jesus”, que significa “O Senhor salva”, como o Anjo lhe explicou: «Porque ele salvará o povo dos seus pecados» (Mt 1, 21). Este aspecto particular da figura de José permite-nos hoje reflectir sobre a paternidade e a maternidade. E acho que isto é muito importante: pensar na paternidade, hoje. Pois vivemos numa época de notável orfandade. É curioso: a nossa civilização é um pouco órfã, e sente-se esta orfandade. Ajude-nos a figura de São José a entender como se resolve o sentido de orfandade que hoje nos faz tanto mal.
Não é suficiente pôr um filho no mundo para dizer que também somos pais ou mães. «Não se nasce pai, torna-se tal... E não se torna pai, apenas porque se colocou no mundo um filho, mas porque se cuida responsavelmente dele. Sempre que alguém assume a responsabilidade pela vida de outrem, em certo sentido exerce a paternidade a seu respeito» (Carta ap. Patris corde). Penso, em particular, em todos aqueles que se abrem a acolher a vida através da adopção, que é uma atitude tão generosa e positiva. José mostra-nos que este tipo de vínculo não é secundário, não é uma alternativa. Este tipo de escolha está entre as formas mais elevadas de amor e de paternidade e maternidade. Quantas crianças no mundo estão à espera de alguém que cuide delas! E quantos cônjuges desejam ser pais e mães, mas não o conseguem por razões biológicas; ou, embora já tenham filhos, querem partilhar o afecto familiar com quantos não o têm. Não devemos ter medo de escolher o caminho da adopção, de assumir o “risco” do acolhimento. E hoje, também, com a orfandade, existe um determinado egoísmo. Há dias, falei sobre o inverno demográfico que há actualmente: as pessoas não querem ter filhos, ou apenas um e nada mais. E muitos casais não têm filhos porque não querem, ou têm só um porque não querem outros, mas têm dois cães, dois gatos… Pois é, cães e gatos ocupam o lugar dos filhos. Sim, faz rir, entendo, mas é a realidade. E esta negação da paternidade e da maternidade diminui-nos, cancela a nossa humanidade. E assim a civilização torna-se mais velha e sem humanidade, porque se perde a riqueza da paternidade e da maternidade. E a Pátria que não tem filhos sofre e – como dizia alguém um pouco humoristicamente – “e agora quem pagará os impostos para a minha reforma, que não há filhos? Quem se ocupará de mim?”: ria, mas é a verdade. Peço a São José a graça de despertar as consciências e pensar nisto: em ter filhos. A paternidade e a maternidade são a plenitude da vida de uma pessoa. Pensai nisto. É verdade, existe a paternidade espiritual e a maternidade espiritual para quem se consagra a Deus; mas quem vive no mundo e se casa, deve pensar em ter filhos, em dar a vida, pois serão eles que lhes fecharão os olhos, que pensarão no seu futuro. E também, se não podeis ter filhos, pensai na adopção. É um risco, sim: ter um filho é sempre um risco, quer natural quer adoptivo. Mas pior é não os ter, é negar a paternidade, negar a maternidade, tanto a real como a espiritual. A um homem e a uma mulher que voluntariamente não desenvolvem o sentido da paternidade e da maternidade, falta algo principal, importante. Pensai nisto, por favor. Espero que as instituições estejam sempre prontas a ajudar neste sentido da adopção, controlando seriamente, mas também simplificando o procedimento necessário para que se realize o sonho de tantos pequeninos que precisam de uma família, e de tantos cônjuges que desejam entregar-se com amor. Há tempos ouvi um testemunho de uma pessoa, um médico – importante a sua profissão – não tinha filhos e com a esposa decidiram adoptar uma criança. E quando chegou o momento, ofereceram-lhes uma e disseram: “Mas não sabemos como será a saúde dela. Talvez possa ter alguma doença”. E ele – tinha-o visto – respondeu: “Se o senhor me tivesse perguntado isto antes de entrar, talvez teria dito não. Mas vi-o: aceito-a”. Esta é a vontade de ser pai, de ser mãe também na adopção. Não tenhais medo disto.
Rezo para que ninguém se sinta sem um vínculo de amor paterno. E quantos estão doentes de orfandade continuem em frente sem este sentimento tão negativo. Possa São José exercer a sua protecção e a sua ajuda sobre os órfãos; e que interceda pelos casais que desejam ter um filho. Por isto, rezemos juntos:
São José,
vós que amastes Jesus com amor de pai, estai próximo das muitas crianças que não têm família e que desejam um pai e uma mãe.
Apoiai os cônjuges que não podem ter filhos, Ajudai-os a descobrir, através deste sofrimento, um projecto maior.
Fazei com que a ninguém falte uma casa, um relacionamento, uma pessoa que se ocupe dele ou dela; e curai o egoísmo daqueles que se fecham à vida, para que possam abrir o coração ao amor. Ámen.
Fontes: Santa Sé; Notícias do Vaticano
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