Paróquia de S. Cristóvão do Muro

Vigararia Trofa/Vila do Conde
Diocese do Porto - Portugal

domingo, 15 de abril de 2018

ENTRADA SOLENE DE D. MANUEL LINDA NA DIOCESE DO PORTO





Às 16H00 de hoje na Catedral do Porto


 
 




Homilia na Entrada Solene na Diocese do Porto

A intimidade com o Ressuscitado
projecta-nos para o serviço dos irmãos


É bela esta passagem do Evangelho: Aquele que congregou os Doze à sua volta, qual verdadeira família, e sofreu a sua fuga e abandono, parece que não consegue viver sem eles.
Por isso, procura-os e recria a antiga convivialidade, como se nada tivesse acontecido.
Para bem deles mesmos, já que, longe de Jesus, se debatem com o remorso, a incredulidade e o medo, somente superados pela oferta do encontro tu-a-tu.
Como que a dizer, a eles e a nós, que a misericórdia de Deus não falha, mesmo quando entra a nossa traição mais vergonhosa.
E que é Ele quem nos procura para dar um sentido empolgante à tentativa de recomeçarmos uma nova caminhada.

Lida em chave catequética, esta passagem evangélica diz-nos também que a «qualidade de vida», inaugurada pelo Ressuscitado, passa por aquelas dimensões que constituem o cerne do discipulado ou do ser Igreja: a evangelização, de que Jesus é Mestre, a ponto de conseguir a proeza de lhes abrir “o entendimento para compreenderem as Escrituras”; a liturgia, já que tudo se passa no contexto da cena dos “discípulos de Emaús que contaram […] como tinham reconhecido Jesus ao partir do pão”; e a caridade, pois o “Mestre e Senhor”, que já tinha dado o exemplo do lava-pés, agora chega ao ponto de se identificar com os esfomeados e implorar “alguma coisa para comer”.
É este anúncio, celebração e compromisso que constitui o cerne do Evangelho, aquele que, nós, aqui no Porto, juramos constituir a nossa “alegria” e “a nossa missão”.

É, também, desta intimidade, verdadeiro paradigma teológico e núcleo embrionário da Igreja, que nasce a obra apostólica, pois os discípulos compreenderam bem “que havia de ser pregado em seu nome o arrependimento e o perdão dos pecados a todas as nações, começando por Jerusalém”.
E que isso os implicava, a ponto de serem constituídos “as testemunhas de todas estas coisas”.
Para quê? A primeira leitura fornece-nos a resposta.

Em todos os tempos e circunstâncias, o homem arrasta consigo a terrível inclinação a contradizer o plano divino.
Se “o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob, o Deus de nossos pais, glorificou o seu Servo Jesus”, as autoridades judaicas e os habitantes de Jerusalém exigiram o seu aniquilamento.
Mesmo que Pilatos tivesse intuído esta inversão dos valores e estivesse “resolvido a soltá-l’O”.
E nós estávamos lá, representados neles.
Por isso, também nós negamos o Santo e Justo e pedimos “a libertação de um assassino”.

A obra da salvação tem de ser recuperada e actuada continuamente porque também é incessante esta tentação de preferir o mal ao bem e de optar pelo mundo das atitudes destruidoras, representadas na história pessoal de Barrabás, gerando a morte do Justo.
É a apavorante sina da humanidade: rejeitar a verdade da existência, representada n’Aquele que São Pedro define como “o Príncipe da Vida”, e eleger a mentira da insensibilidade perante a morte.
Que o digam as vítimas das violências e das guerras.
Mas que os digam também os descartados e marginalizados pela civilização da abundância e do desfrute.

Todos reconhecemos os enormes contributos que os múltiplos sectores da sociedade podem dar para esta necessária e urgente sensatez humana, para se obstar à inversão dos pólos: a transmissão dos valores na família, o inestimável contributo da cultura, a força ordenadora da lei justa, o papel organizador da actividade político-administrativa, a prevenção ou repressão atribuídas às Forças Armadas e às Forças de Segurança, etc.
Não obstante, esta obra de salvação está confiada primordialmente à Igreja, como guardiã da memória d’Aquele que “por nós homens e para nossa salvação desceu dos Céus”.
A comunidade crente actualiza essa salvação agindo, simultaneamente, em dois âmbitos: internamente, na santificação, isto é, no tornar os corações mais sensíveis, mais semelhantes ao de Cristo; externamente, contribuindo para a humanização das organizações e das estruturas, no respeito pela autonomia das realidades terrenas.

Caros diocesanos do Porto, minhas senhoras e meus senhores, esta é a nossa missão.
Porventura, mesmo sem o reconhecer, esta é a fermentação evangélica que o nosso mundo anseia.
Sim, há muitas linguagens e compete-nos sermos especialistas na sua decifração.
E uma das que mais ressoam por aí é o grito da opressão do sem-sentido que tanto fecha a pessoa no seu individualismo narcisista como o conduz ao abandono dos outros.
Ser presença de Igreja neste mundo passa, consequentemente, por “comover [os corações] para desconvocar a angústia e aligeirar o medo”, para usar a belíssima expressão de Agustina Bessa Luís.

Para esta acção pastoral de “comover” os corações, conto com todos.
Com todos.
Conto, sobremaneira, com os jovens.
Porque não sei dizer melhor, repito-lhes as palavras do querido Papa Francisco: “O tempo em que vivemos não precisa de jovens-sofá, mas de jovens com sapatos. Melhor: com as sapatilhas calçadas. Este tempo só aceita jogadores titulares em campo, não no banco de suplentes”.
Jovens e pessoas de todas as idades.

A nossa equipa diocesana do Porto não terá, portanto, suplentes: nem jovens nem crianças, nem adultos nem idosos, nem ricos nem pobres, nem cultos nem humilhados.
Tê-los-á a todos como titulares e em campo.
Certamente treinados e capitaneados pelos bispos e padres.
Não para gáudio destes, mas para, mais organicamente, obter bons resultados e marcar pontos no actuar da salvação no mundo.
Não se retira, portanto, a determinante importância aos pastores, mas eleva-se o timbre de o ser, pois, como escreveu o director de um grande jornal –de facto, a laicidade tem tanto a ensinar-nos!- “o cristianismo é proximidade, o que faz a diferença entre o burocrata e o pastor: um conta o número de ovelhas, o outro procura cuidar delas”.
Pensemos nisto, neste dia em que começa, em todo o país, a Semana de Oração pelas Vocações de especial Consagração.

Caros fiéis em Cristo, estamos todos na «barca de Pedro»: ou navegamos ou nos afundamos. Então, o melhor será remarmos em conjunto.

***

Senhor Núncio Apostólico, interrogo-me sobre as razões da minha nomeação para tão honroso ministério, como seja este de Bispo do Porto, na tradição, por exemplo, desse eminente e inesquecível D. António Barroso, cujo báculo acompanhou todos os meus antecessores, desde há cem anos e, agora, me sustenta a mim próprio.
E não encontro outro motivo que não seja o meu sotaque beirão, mais propriamente da Beira Douro: o Porto já estava habituado a ele desde o senhor D. António Francisco.
Pois bem, se o imito na pronúncia, saiba, igualmente, continuá-lo na simplicidade encantadora, na afectividade envolvente e na bondade contagiante.
É que, tal como ele, também eu estou convencido que só isso lança pontes da Igreja para o mundo e do mundo para a Igreja.
Nesta linha, é com um coração duplamente agradecido que ressalto o gesto das Câmaras Municipais do Porto e de Vila Nova de Gaia de atribuir o nome de D. António Francisco dos Santos à nova ponte, estrutura de aproximação e de encontro: agradeço este tributo à Diocese do Porto que teve este ilustríssimo bispo como seu condutor; e agradeço esta interpelação que me é feita, a mim, pessoalmente, qual seja a necessidade de nunca me esquecer que um bispo é, por natureza e mandato divino, um «pontífice», um construtor de pontes.

Tentá-lo-ei com a ajuda divina que imploro por intermédio da «Rosa mística», a Virgem Santa Maria, venerada como Senhora da Assunção em toda a Diocese e como Senhora da Vandoma nesta nossa cidade episcopal.

Movidos pelo amor de Deus”, vamos à nossa obra, irmãos.


+ Manuel Linda




Fonte: Diocese do Porto; Agência Ecclesia



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