Há
27 anos, a 13 de Abril de 1989, morreu D. António Ferreira Gomes,
Bispo do Porto de 1952 a 1982
D.
António Ferreira Gomes nasceu a 10 de Maio de 1906 na freguesia S.
Martinho de Milhundos, Penafiel e faleceu em Ermesinde a 13 de Abril
de 1989.
Aos
10 anos entrou para o Seminário, prosseguindo os estudos
filosófico-teológicos em Roma, na Universidade Gregoriana, de 1925
a 1928.
A
22 de Setembro de 1928, aos 22 anos, é ordenado presbítero
por D. António Augusto de Castro Meireles.
É
Cónego da Sé do Porto em 1936 e Bispo Coadjutor
de Portalegre de 1949 a 1952.
De
1952 a 1982 é Bispo do Porto, tendo sido exilado de 1959 a 1969.
Aos
75 anos, em 1982, vem
a resignar
ao cargo de Bispo do Porto.
Norteou o seu serviço à Igreja pela difusão dos valores da liberdade e da dignidade do homem, valores que o levarão ao exílio quando nos anos 50 do século XX se manifesta contra a concepção totalitária do estado.
A
causa próxima do exílio forçado terá sido um pró-memoria
enviado ao Presidente do Conselho António de Oliveira Salazar.
Após
a campanha do General Humberto Delgado para a Presidência da
República, enviou um pró-memoria a Salazar
para anteceder uma prevista conversa com este - “Acho
porém preferível enviar primeiro, por escrito, os pontos
fundamentais dessa minha declaração, a fim de poder ser útil a
nossa conferência”.
Prossegue
mais à frente:
“...
a Igreja em Portugal está perdendo a confiança dos seus melhores”.
[…]
“Apresentarei
apenas dois factos, que, podendo servir de símbolos, são já
de si realidades enormes.
No
Minho, coração católico de Portugal, onde se pensava que bastaria
sempre o abade dar o alamiré e todos entravam imediatamente no coro,
no Minho católico, mal os padres começavam a falar de eleições,
os homens, sem se importarem com o sentido que seria dado ao ensino,
retiravam-se afrontosamente da igreja.
Nas
juventudes da Acção Católica, onde tanto se quis dizer que os
padres andavam a lançar inquietações e dúvidas, os dirigentes
mais responsáveis saltam fora dos quadros e da disciplina, para
manifestarem a sua inconformidade e desespero, fugindo ao
conhecimento dos assistentes (que, apesar de tudo, lhes aconselhariam
paciência).
São
os dois pólos, o da tradição e o da recristianização: do que
fica no meio facilmente se poderá julgar.
Está-se
perdendo a causa da Igreja na alma do povo, dos operários e da
juventude; se esta se perde, que poderemos esperar da sorte da
Nação?”
Ao
terminar o Pro memoria para a conversa com Salazar, o bispo do Porto
lançou quatro perguntas relativas às possíveis objecções que o
Estado teria à acção da Igreja e dos católicos:
“Em
consequência e à luz de tudo quanto escrevi, condensarei aquilo que
desejaria perguntar a V. Exa em quatro pontos:
1°-
Tem o Estado qualquer objecção a que a Igreja ensine livremente e
por todos os meios, principalmente através das organizações e
serviços da Acção Católica e da Imprensa, a sua doutrina social?
2°-
Tem o Estado qualquer objecção a que a Igreja autorize, aconselhe e
estimule os católicos a que façam a sua formação cívico-política,
de forma a tomarem plena consciência dos problemas da comunidade
portuguesa, na concreta conjuntura presente, e estarem aptos a
assumir as responsabilidades que lhes podem e devem caber, como
cidadãos católicos?
3°-
Tem o Estado qualquer objecção a que os católicos definam,
publiquem e
propaguem
o seu programa ou programas, politicamente situados, em concreto hic
et nunc, o que evidentemente não pode ir sem o despertar de
esperanças de mutações ousadas e substanciais e do seu clima
emocional?
4°-
Tem o Estado qualquer objecção a que os católicos, se assim o
entenderem e quando o entenderem, iniciem um mínimo de organização
e acção políticas, a fim de estarem aptos, nas próximas eleições
legislativas ou quando o julgarem oportuno, a concorrer ao sufrágio,
com programa definido e com os candidatos que preferirem?
—
Desejo precisar que, ao formular
estas perguntas, não quero sugerir qualquer benevolência ou favor
para com a actividade cívico-política dos católicos; antes, pelo
contrário, penso que se não forem capazes de aguentar o desfavor e
a animosidade do Poder, pouco podem merecer o respeito e a liberdade.
Apenas
sugiro e peço, mas isso com toda a nitidez e firmeza, o respeito, a
liberdade e a não-discriminação devidos ao cidadão honesto em
qualquer sociedade civil.”
Uma
“fuga de informação” (como agora se diz, e é comum), de um
amigo de D. António e de um ministro de Salazar, sobre a missiva a
Salazar veio a causar grande polémica nos jornais.
Tornou-se
assim persona non grata para o regime e a 24 de Julho de 1959
sai do país, por ser aconselhado a retirar-se por uns tempos para
férias, e é depois proibido de entrar.
É
forçado a um exílio de dez anos em Vigo, Santiago de Compostela e
Valência, na Alemanha e na França, em Lourdes.
No
Concílio Vaticano II está em Roma.
Em
1969, Marcelo Caetano autoriza a sua entrada em Portugal, reassumindo
D. António o cargo de Bispo do Porto a 4 de Julho de 1969.
Deixou
testamento, redigido em 21 de Agosto de 1977, onde testemunha o
desprendimento nobre e a pobreza essencial que nortearam a sua vida e
revela a criação da Fundação
Spes, com fins benéficos, educativos e culturais.
Como
foi referido acima, aos 75 anos, em 1982, vem a resignar ao cargo de
Bispo do Porto, falecendo na Quinta da Mão Poderosa, casa da diocese
em Ermesinde, a 13 de Abril de 1989.
“De
joelhos diante de Deus, de pé diante dos homens”,
frase de sua autoria inscrita numa parede do Seminário de Vilar.
Poema
de Sophia de Mello Breyner Andersen sobre D. António Ferreira Gomes:
D.
António Ferreira Gomes
Na
cidade do Porto há muito granito
Entre
névoas sombras e cintilações
A
cidade parece firme e inexpugnável
E
sólida – mas habitada
Por
súbitos clarões de profecia
Junto
ao rio em cujo verde se espelham as visões
Assim
quando eu entrava no Paço do Bispo
E
passava a mão sobre a pedra rugosa
O
paço me parecia fortaleza
Porém
a fortaleza não era
Os
grossos muros de pedra caiada
Nem
os limites de pedra nem a escada
De
largos degraus rugosos de granito
Nem
o peso frio que das coisas inertes emanava
Fortaleza
era o homem – o Bispo –
Alto
e direito firme como torre
Ao
fundo da grande sala clara: fortaleza
De
sabedoria e sapiência
De
compaixão e justiça
De
inteligência a tudo atenta
E
na face austera por vezes ao de leve o sorriso
Inconsútil
da antiga infância.
Sophia
de Mello Breyner Andresen
Biografia
em vídeo de D. António Ferreira Gomes – 6:54
D.
António Ferreira Gomes ao serviço da liberdade – 1:49
Entrevista
de Miguel Sousa Tavares a D. António Ferreira Gomes – 1:38
Documentário
RT2 "D. António Ferreira Gomes - De Joelhos diante de Deus, de
Pé diante dos Homens" –
58:59
Para
mais informação, pode consultar:
Fontes:
Diocese do Porto; Fundação SPES
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