Inaugurado
a 7 de Julho de 1996 o templo projectado pelo arquitecto Álvaro Siza
Vieira ainda está a ser pago pela comunidade local mas já precisa
de obras de conservação e restauro
Nota
Histórico-Artística
A
Igreja de Santa Maria, paroquial da Freguesia de Santa Marinha de
Fornos do Concelho de Marco de Canaveses é, também, a igreja de
Siza.
Enquanto
tal, isto é, como projecto e obra de um Arquitecto de excepção,
ela incorpora um valor de exemplaridade incontornável, o qual tem
logrado metamorfoseá-la em objecto de interesse científico,
argumentos indubitavelmente atendíveis no quadro de uma
patrimonialização em sede institucional-legal.
À
semelhança do "génio do respectivo criador", critério
genérico de apreciação para a aplicação da protecção conferida
pelos instrumentos da classificação e inventariação , uma
genialidade que, tendo embora uma autoria projectual definida - a que
pertence ao Arquitecto Álvaro Siza Vieira - não deixa de integrar a
genialidade de uma autoria difusa: referimo-nos a essa confluência
de vontades maturada no transcurso do tempo e que ousou sonhar, com
dimensão nova , o monumento religioso e litúrgico entretanto
materializado.
Julgamos,
por isso, oportuno dar conta do percurso da paróquia na busca do seu
novo espaço cultural-devocional:
"[...]
A 3 de Janeiro de 1973 o quinzenário local "Ecos do Marco de
Canaveses" noticiava em primeira página a constituição duma
comissão para construir uma nova igreja.
Foram
recolhidos alguns donativos, mas o projecto nunca foi por diante.
Seria
erguida no centro da vila, em terrenos da Quinta dos Murteirados.
Precisamente no local onde, vinte e um anos mais tarde, nasceria a
igreja de Siza.
O
desenvolvimento urbano que se seguiu à Revolução de Abril (1974)
acentuou definitivamente a necessidade de um templo mais amplo, mais
adequado às reformas entretanto verificadas na liturgia e mais
próximo do centro populacional.
Assim,
em finais de 1988, a mudança de pároco e a motivação daí
resultante, o apelo de renovação imposto pelos "novos"
tempos" e a evidência da necessidade, conjugaram-se para o
aparecimento de uma sensibilidade forte da qual resultaria a
construção da nova igreja.
O
processo de adesão e entusiasmo que, então, se gerou não é de
fácil compreensão: a paróquia é relativamente pequena e de parcos
recursos, a igreja a construir não seria "fácil e popular"
e os custos previstos não eram nada animadores.
Por
outro lado, o tecido sociológico do Marco não parecia ser muito
consistente, pois ao núcleo urbano, constituído por pequenos
comerciantes e serviços públicos, havia que ligar um importante
núcleo de bairro e ainda uma parte tipicamente rural.
Quando
as obras se iniciaram, a 10 de Abril de 1994, muitos ainda tinham
dúvidas quanto ao sucesso do empreendimento.
Apesar
disso, a grande maioria da população estava expectante, mas
entusiasmada e unida em torno da sua obra.
Passados
pouco mais de dois anos, a 7 de Julho de 1996, a igreja era
inaugurada e, por vontade dos paroquianos, expressa em referendo,
dedicada a Santa Maria.
Nesse
dia não foi difícil perceber que todas as canseiras tinham sido
recompensadas e que um enorme contributo para a renovação da arte
sacra tinha sido dado por uma paróquia modesta, praticamente
desconhecida e de escassos recursos materiais. […]"
In
Igreja de Santa Maria - Marco de Canaveses. Marco de Canaveses:
Paróquia de Santa Marinha de Fornos e Francisco Guedes, 1998
O
Concílio do Vaticano II, na constituição Sacrosanctum Concilium
sobre a sagrada liturgia, defende que a Igreja deve promover a arte
do seu tempo, demonstrando confiança no tempo presente e nos
múltiplos meios que a criatividade contemporânea tem à sua
disposição.
Neste
sentido, a igreja de Marco de Canavezes é um contributo importante
para a arquitectura religiosa, e entende-se que seja considerada em
Portugal como no estrangeiro, ponto de passagem incontornável para
o(s) construtor(es) de igreja(s).
E
é sob este ponto de vista que se percebem os vários prémios
internacionais que lhe foram atribuídos - Prémio IberFAD de
Arquitetura, em 1998, pelo Fomento de las Artes Decorativas de
Barcelona e Prémio Internacional de Arquitetura Sacra, em 2000, pela
Fundação Frate Sole -, bem como o destaque recebido no 4º
Congresso Internacional Architettura e Liturgia nel Novecento,
realizado em Veneza em 2006.
Os
vinte anos da dedicação da Igreja de Santa Maria
No
passado dia 10 de Julho o nosso bispo D. António celebrou os 20 anos
da dedicação da igreja de Santa Maria.
Em
entrevista à Agência Ecclesia o bispo do Porto considerou a
comemoração uma oportunidade para a afirmação da “unidade e
comunhão” da paróquia local.
“Celebrar
20 anos é para agradecer também, para agradecer a esta comunidade
que levou por diante este belíssimo projecto, e ao mesmo tempo para
dar novas energias juntamente com o nosso pároco, para levarmos por
diante o cumprimento digno das nossas responsabilidades financeiras
que temos e para o concluir porque o projecto ainda não está
concluído.”
Duas
décadas depois, a obra ainda permanece em parte por pagar, cerca de
600 mil euros, que poderão ser regularizados num espaço de 25 anos,
segundo um plano já aprovado.
No
total foram pagos até agora 2,3 milhões de euros, uma verba reunida
ao longo dos anos graças ao esforço “heróico” da comunidade
católica local, lembrou D. António Francisco dos Santos.
Em
causa está sobretudo o revestimento dos pórticos com mais de 10
metros que constituem a entrada principal do templo.
Com
o passar do tempo, a igreja de Santa Maria, e também o centro
paroquial ao lado, já acusam também algum desgaste, estando
necessitados de várias obras de conservação e restauro.
A
ideia, que está a ser trabalhada com o arquitecto Álvaro Siza
Vieira, é concluir os trabalhos no templo até Outubro deste ano, a
tempo da vinda à paróquia do presidente do Conselho Pontifício
para a Cultura, o cardeal Gianfranco Ravasi.
"Teremos
as portas concluídas até finais de Outubro, para o grande congresso
de arquitectura que vamos aqui efectuar, entre 31 de Outubro e 01 de
Novembro, com a presença do cardeal Ravasi, de grandes críticos de
arquitectura, e do próprio Álvaro Siza Vieira", revelou o padre
Fernando Coutinho, pároco de Santa Marinha de Fornos.
No
âmbito das comemorações dos 20 anos da dedicação da igreja de
Santa Maria, em Marco de Canaveses, foi lançado um novo guião sobre
o templo, a abertura de uma exposição de pintura e a criação de
um novo selo a assinalar a efeméride.
Da entrevista de D. António, Bispo do Porto, à Agência Ecclesia
“Celebrar
20 anos da construção desta igreja que é uma referência pela
beleza do seu projecto, pelo talento do seu arquitecto, o arquitecto
Álvaro Siza Vieira, e pelo envolvimento de toda a comunidade.”
Homilia
de D. António na igreja de Santa Maria do Marco de Canaveses a 10 de
Julho de 2016
1.Os
evangelhos que se proclamam ao longo destes próximos domingos
trazem-nos narrações e ensinamentos, a partir do encontro de várias
pessoas com Jesus, que com Ele cruzaram no caminho para Jerusalém.
Hoje,
S. Lucas fala-nos do sugestivo diálogo de um doutor da lei que
interroga Jesus para o experimentar.
E
desta iniciativa surge uma bela lição que a todos nos aproveita e
um prático conselho, que a todos é útil.
No
termo do encontro, já não é o doutor da lei que interroga Jesus,
mas sim Jesus que questiona o doutor da lei.
À
pergunta de Jesus sobre quem é o próximo do homem caído em
desgraça e deixado à beira da estrada pelos salteadores, responde o
doutor da lei: “O que teve compaixão dele” (cf. Luc 10 25,-37).
E
a recomendação de Jesus não se fez esperar: “Então, vai e faz o
mesmo” (Luc 10, 37).
Vim,
hoje, ao vosso encontro, para rezarmos juntos e para celebrarmos a
Eucaristia.
Somos
uma comunidade congregada à volta do altar e reunida para escutar a
Palavra de Deus e se alimentar do Corpo de Cristo, por nós entregue,
e do Seu Sangue, por nós derramado, cumprindo o memorial vivo da
Última Ceia de Jesus, no Cenáculo de Jerusalém.
Este
momento é tempo de encontro com a família paroquial de Santa
Marinha de Fornos, no coração da cidade do Marco de Canaveses e
encontro, também, com a memória abençoada e com o testemunho
cristão dos nossos antepassados, que ao longo da história foram
edificando templos cristãos, em cada tempo e em cada lugar.
A
obra que, há vinte anos, D. Júlio Tavares Rebimbas dedicou a Deus
para ser templo cristão, constituiu-se, agora, lugar sagrado, onde
Deus diariamente se reúne com o Seu povo.
Saúdo-vos,
irmãos e irmãs, desta Paróquia de Santa Marinha de Fornos, no
Marco.
Foi
para vós e com a vossa fecunda generosidade que este templo foi
pensado e concebido, projectado e construído.
Sei
do sonho sublime, embalado desde o início, da ousadia corajosa do
projecto, da maestria do seu arquitecto e da persistente entrega e
reconhecido zelo dos sacerdotes que aqui foram párocos neste arco do
tempo.
Damos
graças a Deus!
2.
Ao evocarmos o dia em que dedicámos a Deus este templo sagrado e
consagrámos o altar desta igreja matriz da cidade do Marco queremos
lembrar que ela é para nós, a partir daí, lugar da celebração da
fé e dos sacramentos, casa da família cristã e escola de comunhão
de toda a paróquia.
Rezamos,
aqui, hoje, para que, iluminados pela beleza impressionante da luz
natural, que de Deus nos vem, e olhando através da janela rasgada na
parede larga voltada para a cidade, de onde se vê o horizonte da
terra e do céu que nos envolvem, se confirme a nossa fé, se
revigore a nossa esperança e se aumente o nosso amor a Deus e o
nosso serviço à Humanidade.
Sabemos
todos que não é apenas o esforço humano, o avanço científico e o
progresso técnico que trazem luz, esperança e futuro ao mundo.
Mas
sabemos, igualmente, como é bom estar presentes nesta vastíssima
geografia da cultura, do talento e do engenho humanos para abrir
novas clareiras ao diálogo entre a fé e a razão e estabelecer
pontes entre o culto e a cultura.
Só
assim daremos lugar à beleza, que em nós mora, como caminho de
aproximação de Deus e faremos da nossa vida lugares de beleza, como
nos pedia o Papa Bento XVI, em 12 de maio de 2010, no Centro Cultural
de Belém.
A
fé é uma chama pequena, minúscula, mas é sempre mais forte do que
a escuridão, que se vive no nosso tempo de crise do pensamento, de
fragilidade das instituições e de colapso de valores.
Esta
Igreja nova é prova desta chama de luz, que devemos fazer brilhar
para que um amanhã novo de fé, de esperança e de amor comece a
irromper no horizonte da nossa terra e no coração das suas gentes.
Sem
nunca se afastar do traço inicial da sua primeira finalidade que
consiste em ser templo cristão para uma comunidade que reza e
cresce, ela constitui um pólo aglutinador entre a fé e a procura da
beleza nas sendas do talento e da arte, que são, também, caminho de
encontro com Deus.
Aqui
está presente o talento internacionalmente reconhecido e
universalmente respeitado do seu autor, o arquitecto Álvaro Siza
Vieira, que assim vincula o seu nome para sempre à nossa Terra e nos
honra a todos nós.
Cumpre-nos,
depois de tantos e demorados anos de esforços heróicos, retomarmos
forças para levarmos por diante e concluirmos tão audacioso
projecto.
Aqui
estamos todos, para, com o nosso Pároco, com a colaboração
determinada de colaboradores incansáveis, com a generosidade nunca
esgotada no coração dos crentes das Terras de Canaveses e com a
compreensão das autoridades, instituições e empresas locais
cumprirmos dignamente os encargos assumidos, para que a Igreja aqui
construída irradie a beleza da fé e a alegria da comunhão em todos
os horizontes desta nova cidade.
Esta
igreja é sinal cristão bem visível a dizer-nos que aqui habita o
Deus de Jesus Cristo.
Bastará
uma centelha de confiança e uma semente de generosidade, por mais
pequenas que sejam, para que também, a partir daqui, se iluminem de
fé e brilhem de júbilo a Cidade do Marco e a Igreja do Porto.
A
Igreja não se abre apenas aos que entram pela grande porta que nos
acolhe à entrada e nos recebe no interior amplo, belo e digno deste
templo, onde Deus habita e a comunidade cristã se congrega.
A
Igreja abre-se, também, para o exterior, a novos átrios de cultura
e a criativos caminhos de missão, franqueados a todos, sem excepção,
para acolher os que procuram Deus, de tantas formas e por caminhos
tão diversos.
Percebemos
que, daqui, se vê, com um olhar aberto e lúcido, o mundo a
evangelizar e se pode dialogar, de maneira nova, com a cultura do
nosso tempo.
Irmãos
e irmãs: edifiquemos, também nós, com zelo renovado, alento novo,
entusiasmo acrescido e abertura à missão evangelizadora a Igreja de
pedras vivas, que todos somos desde o baptismo.
Que
esta Igreja matriz, situada no coração desta jovem cidade do Marco,
nos inspire este jeito humilde, sereno, compassivo e dialogante de
acolher e conviver como irmãos e nos incentive este zelo
evangelizador e missionário da Igreja, aberta ao mundo, nestes
tempos novos em que vivemos o Jubileu da Misericórdia, a que o Papa
Francisco nos convoca.
Hoje
somos, também nós, convocados para celebrar na Sé do Porto -
Igreja mãe de todas as igrejas da Diocese a ordenação de cinco
novos sacerdotes e de quatro diáconos.
Demos
graças a Deus por eles e com eles! Eles ajudam-nos a compreender que
somos chamados a ser pedras vivas do templo do Senhor e servidores
incansáveis, disponíveis e generosos da sua Igreja.
3.
Que Santa Maria, Mãe de Deus e nossa Mãe, a quem quisestes dedicar
esta nova Igreja e constituí-la nossa padroeira, nos abençoe e
proteja com a sua intercessão.
Marco
de Canaveses, igreja de Santa Maria, 10 de Julho de 2016
António,
Bispo do Porto
Fontes:
Direcção-Geral do Património Cultural; Secretariado Nacional da
Pastoral da Cultura; Agência Ecclesia; Diocese do Porto
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