Cónego
Rui Osório
Durante
a minha vida profissional, ninguém me explicou a eventualidade de,
um dia, um Governo português decidir diminuir a pensão a que teria
direito quando cumprisse os 65 anos e por ter sido honesto nas minhas
obrigações, com o privilégio de ter trabalhado em empresas
cumpridoras. Pensava, ingenuamente, que o Governo, a ser democrático,
como tanto desejava, seria pessoa de bem.
Foi
uma ilusão, que tenho pago caro, ter sido tão ingénuo! Puro
engano!
Acreditei
de boa fé na seriedade e fiabilidade dos compromissos e, afinal,
tenho vindo a ser esbulhado na minha pensão, com sacrifícios que
pesam - e isso ainda me faz sofrer mais - na vida de tantos
reformados, alguns dos quais, da minha geração, estão a ser o
suporte de retaguarda de filhos desempregados e de netos que crescem
para a vida.
Estamos,
para bem, a viver uma esperança de vida alargada, mas, para mal, a
pagar uma factura muito cara, que nos desgraça impunemente a
qualidade de vida!
Sou
do tempo em que entravam nos cofres públicos mais contribuições de
quem exercia activamente a sua vida profissional do que os custos que
o Estado suportava a pagar pensões. Mesmo assim, nunca acusei o
Estado de se servir desses fundos para cobrir, não sei se com acerto
e justiça, os seus défices e em que áreas era deficitário e que
precisariam das contribuições de trabalhadores honrados.
É
preciso chegarmos a velhos para que o Estado faça pouco de nós,
somando os seus maus tratos às nossas fragilidades, agravando-as até
a uma pesada amargura. Trata-nos como pessoas descartáveis,
usando-as e deitando-as fora.
Chega-nos
agora a Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES) como
mais um veneno a matar-nos a esperança. Se não é um imposto, o que
será para, ao menos, entendermos se vale a pena tantos sacrifícios?
Lamento
ter andado uma vida longa a aconselhar a ética dos impostos para
convencer as pessoas a ter respeito pelo bem comum que nos competiria
salvaguardar e não apenas ao Estado. Vivendo do meu salário de
profissional da Imprensa, estatuto que sempre teve a concordância
explícita dos meus bispos, decidi renunciar a qualquer legítima
remuneração por serviços pastorais, exercendo o ministério
sacerdotal em regime de voluntariado. O salário chegava-me, como
sonhava que a reforma também me bastaria.
Mais
um engano na minha ingenuidade, espoliada e maltratada por um Governo
sanguessuga.
Não
estou arrependido por ter semeado o bem. A minha consciência social
não a troco por nada. Considero a CES uma abusiva e vergonhosa
arbitrariedade. Como escrevia, há dias, Bagão Félix, ex-ministro
das Finanças, “a ideologia punitiva sobre os mais velhos
prossegue entre um muro de indiferença, um biombo de manipulação,
uma ausência de reflexão colectiva e uma tecnocracia gélida”.
Fonte:
Voz Portucalense, 22Jan2014
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